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dudesiuffo

Olá, estranho!

A quarentena tem feito a gente sentir-se meio solitário... Claro! Tem pessoas que já chutaram o balde há tempos e saem deliberadamente para aglomerações (sério isso?!). Tem outras, contudo, que simplesmente não saem de casa há um ano! É o caso de N.


N mora com seu pai e sua avó e, como seu pai precisa sair para trabalhar, ela fica em casa e cuida da avó. Mesmo morando com as pessoas que mais ama, N não pode evitar de sentir-se solitária. Ela frequentemente conversa com os amigos por chamada de vídeo ou ligação. Porém, é diferente…


A solidão de N fazia coisas terríveis com a sua cabeça. Ela parecia inquieta, triste, inútil e se irritava facilmente, até com a própria respiração! Chegou ao ponto em que nem mesmo seus amigos reconheciam aquela menina do outro lado da tela. Antes risonha e alegre, N começou a parecer cabisbaixa e pessimista.


No entanto, de uns tempos para cá, N decidiu arriscar um pouco (pelo bem da sua sanidade): ela passou a ir à piscina do prédio todas as manhãs.


Sempre que ia à piscina, ela via o vizinho do 802 na academia do prédio. Toda vez que tomava sol, lá estava ele exercitando-se. Cumprimentavam-se rapidamente, com um breve aceno de cabeça. Não conversavam, nem mesmo se olhavam, somente coexistiam no mesmo espaço. A presença dele lá, entretanto, de alguma forma, trazia-lhe um conforto inexplicável e ela se sentia menos sozinha.


Um dia, N decidiu arriscar um pouquinho mais: foi à academia... Com o vizinho do 802!


Bem... de início, não foi exatamente com ele. N tentou, apenas, diminuir o espaço em que coexistiam e foi exercitar-se junto ao seu vizinho.


No primeiro dia de malhação juntos, estranharam-se. No segundo, N (finalmente!) descobriu o nome do seu mais novo comparsa: T. No terceiro, trocaram algumas palavras. Uma semana depois, T já estava convidando N para treinarem juntos (ele é estudante de educação física e tinha ótimas dicas fitness).


A partir daí, N e T criaram uma espécie de rotina íntima: iam para a academia, malhavam, depois tomavam um banho de piscina (ela conseguiu convencê-lo de que ir para piscina era o melhor pós-treino). Ele passava exercícios que a desafiavam mais e mais. N começou a ensiná-lo libras (ela havia feito um curso de 1 ano em 2019 :). Malhavam, conversavam, divertiam-se e ajudavam-se.


Após alguns meses com essa rotina diária, N parou de sentir-se solitária, embora ainda houvesse a saudade dos amigos, da faculdade e de toda a vida que tinha pré-pandemia. Entretanto, ela agora encarava seus dias com menos melancolia. Voltou a fazer aquelas aulas de francês que tinha desistido, estava mais empenhada nos estudos e até fez as pazes com seu corpo. Ela se sentia motivada, com um propósito. Finalmente, N enxergava uma luz no fim do túnel.


Isso tudo foi possível porque ela conheceu alguém que, no meio dessa loucura pandêmica toda, procurou crescer junto com ela. Talvez, tudo que ela precisasse era um empurrãozinho, um estímulo externo que a fizesse cair na real ou que a tirasse do buraco que estava cavando para si mesma, sem perceber. Talvez T estivesse no lugar certo na hora certa. Talvez N e T tenham se encontrado por algum motivo especial.


Plot twist da história: há um mês, T, infelizmente, mudou-se do prédio de N e agora está morando do outro lado da cidade. Contudo, pela janela do meu quarto, ainda é possível ver uma garota magricela pegando peso na academia do Edifício M.L., correndo na esteira e, em seguida, tomando um banho de piscina ao som de Ariana Grande. Ela está lá sozinha. Por outro lado, nunca pareceu tão alegre e risonha quanto agora.


(Lost in Translation - 2003)

(PS: aquele beijo na última cena estragou o final)


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1 Comment


anasiuffo
anasiuffo
Apr 05, 2021

Pefeita e sensível, como sempre ♥

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