Suíte n°1

Honestamente, sempre soube que não éramos uma orquestra sinfônica.

Cada um tinha seu gosto, seu tom. Um constante descompasso, sem sintonia, uma discussão incessante sobre o melhor ritmo. Seu timbre não me agradava, ao passo que a forma como eu regia a mim mesma com a minha batuta, você desaprovava.

Eu tocava os intrumentos de corda. Você, os de sopro. Sentia um frio na espinha a cada expiração sua ao tocar, à espera do julgamento do meu dedilhado, em busca de defeitos no meu som. Acreditar que ele pudesse ser tão belo, tão inteligente, quanto o seu, parecia-lhe tão improvável...

Após tantos sussurros cantados, um medo alcançou meu âmago e tornou-se contralto. Apavorava-me o desatino entre a sua apresentação de notas afinadas ao público e aquela melodia sombria, tocada para mim no camarim. Você se tornara o maestro da minha orquestra.

Assim, os decibéis dessa melodia obscura desafinaram-me. Aos poucos, cortei as minhas cordas por você. A falta delas não me deixou mais bonita, apenas lhe agradei mais. Estava tão envolvida que deixei levar-me pela sua sinfonia. Permiti que me moldasse de acordo com seu tom e tocasse seguindo seus acordes... Eu tinha esperança de que um dia minhas notas fossem percebidas. Entretanto, sua regência foi tão boa que não reparei minha esperança perdendo a intensidade.

Um dia, cansei de apagar-me em nome do brilho do seu solo. Falhei na tentativa de lhe fazer entender que a nossa orquestra só seria perfeita se tocássemos em harmonia. Busquei, sutilmente, a afinação para recuperar meu soprano e redescobrir meu próprio tom. Encontrei novas cordas que, lentamente, substituiram aquelas que você me ajudou a cortar. Para, então, nunca mais tocar com sua orquestra.